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sexta-feira, 17 de setembro de 2010

FESTA DA IMPRESSÃO DAS CHAGAS DE NOSSO PAI SÃO FRANCISCO

O Seráfico Pai Francisco, desde o início de sua conversão, dedicou especialíssima devoção e veneração a Cristo crucificado, devoção que até à morte ele inculcara a todos por palavras e exemplo. Quando em 1224 Francisco abismava em profunda contemplação no Monte Alverne, por um admirável e estupendo prodígio, o Senhor Jesus imprimiu-lhe no corpo as chagas de sua paixão. O Papa Bento XI concedeu à Ordem dos Frades Menores que todos os anos, neste dia, celebrasse a memória de tão memorável prodígio, comprovado pelos mais fidedignos testemunhos (Próprio da Família Franciscana do Brasil, Vozes, 1999, pág.253)


Das Fontes Franciscanas “Dois anos antes de entregar sua alma ao céu, estando no eremitério que, por sua localização, tem o nome de Alverne, Deus lhe deu a visão de um homem com a forma de um Serafim de seis asas, que pairou acima dele com os braços abertos e os pés juntos, pregado numa cruz. Duas asas elevavam-se sobre a cabeça, duas abriam-se para voar e duas cobriam o corpo inteiro. Ao ver isso, o servo do Altíssimo se encheu da mais infinita admiração, mas não compreendia o sentido. Experimentava um grande prazer e uma alegria enorme pelo olhar bondoso e amável com que o Serafim o envolvia. Sua beleza era indizível, mas o fato de estar pregado na cruz e a crueldade de sua paixão atormentavam-no profundamente. Levantou-se triste e alegre ao mesmo tempo, se isso se pode dizer, alternando em seu espírito sentimentos de gozo e de padecimento. Tentava descobrir o significado da visão e seu espírito estava muito ansioso para compreender o seu sentido. Estava nessa situação, com a inteligência sem entender coisa alguma e o coração avassalado pela visão extraordinária, quando começaram a aparecer-lhe nas mãos e nos pés as marcas dos quatro cravos, do jeito que as vira pouco antes no crucificado” (1Cel 94).

“Francisco era um fiel servidor de Cristo. Dois anos antes de sua morte, havendo iniciado um retiro de Quaresma em honra de São Miguel num monte muito alto chamado Alverne, sentiu com maior abundancia do que nunca a suavidade da contemplação celeste, o ardor dos desejos sobrenaturais e a profusão das graças divinas. Transportado até Deus num fogo de amor seráfico, e transformado pelos arroubos de uma profunda compaixão n’Aquele que, em seus extremos de amor, quis ser crucificado, orava certa manhã numa das partes do monte. Aproximava-se a festa da Exaltação da Santa Cruz, quando ele viu descer do alto do céu, dir-se-ia, um serafim de seis asas flamejantes, o qual, num rápido voo, chegou perto do lugar onde estava o homem de Deus. O personagem apareceu-lhe não apenas munido de asas, mas também crucificado, mãos e pés estendidos e atados a uma cruz. Duas asas elevavam-se por cima da cabeça, duas outras estavam abertas para o voo, e as duas últimas cobriam-lhe o corpo” (Lm VI,1)

Sentido desta Festa para nós, hoje
Homilia da Festa no Monte Alverne (Itália) feita por Frei José Rodríguez Carballo, Ministro Geral OFM – 17 de setembro de 2010

Textos bíblicos: Gl 6, 14-18; Lc 9, 23-26


Há poucos dias celebramos a Festa da Exaltação da Santa Cruz. Hoje, em todo o mundo franciscano e particularmente nesta santa montanha do Alverne, santificada pela presença do Senhor em forma de serafim e pela de Francisco, o Estigmatizado do Alverne, celebramos o mistério da Cruz que se fez visível na carne do Poverello, realizando-se em seu corpo, de forma visível, aquilo diz o Apóstolo: «De agora em diante ninguém me moleste, pois levo sobre meu corpo os estigmas de Jesus» (Gl 6,17). Paulo portava em seu corpo as cicatrizes das tribulações suportadas por Cristo (cf. 2Cor 6,4-5; 11,23ss), Francisco leva nas mãos, pés e lado os estigmas da Paixão de Cristo.


As biografias do Santo nos narram como sucedeu o prodígio de todo singular dos Estigmas. Próximo à festa da Santa Cruz, dois anos antes de sua morte, o Seráfico pai subiu a esta montanha, para iniciar a quaresma de jejum que costumava praticar em honra do Arcanjo São Miguel. Desejando ardentemente conhecer a vontade de Deus, para configurar-se todo a Cristo, abriu por três vezes o livro dos evangelhos em nome da Santíssima Trindade, e encontrando sempre a narração da Paixão do Senhor Jesus, orava insistentemente sentir em seu corpo as dores do Crucificado. Teve, então, uma visão que produziu nele um grande gozo e uma profunda dor ao mesmo tempo: era o Senhor em forma de serafim crucificado que lhe manifestava que havia de ser transformado totalmente na imagem de Cristo crucificado. Terminada a visão apareceram na carne deste amigo de Cristo os sinais da Paixão do Senhor: os cravos que traspassaram suas mãos e seus pés, e uma ferida em seu lado (cf. LM XIII, 1ss).



Nesta memória litúrgica dos Estigmas de São Francisco, procuremos acentuar alguns aspectos importantes que nos oferecem este evento prodigioso, partindo da narração que nos oferece São Boaventura. O Doutor Seráfico introduz a narração da impressão das chagas com estas palavras: «Francisco havia aprendido a distribuir tão prudentemente o tempo posto à sua disposição: parte dele o empregava em fadigas apostólicas em favor de seu próximo, parte o dedicava às tranqüilas elevações da contemplação. E continuava, por isso, depois de haver se empenhado em procurar a salvação dos outros segundo o exigiam as circunstancias de lugares e tempos, abandonando o barulho das multidões, dirigia-se ao mais recôndito da solidão» (LM XIII, 1).


Francisco nos ensina que não podemos ser todo para os outros se não se é todo para o Senhor, e não se pode ser todo para o Senhor se a pessoa não se encontra constantemente consigo mesma. O Poverello nos ensina a necessidade de ter na própria existencia um “projeto de vida ecológico”, diríamos hoje, no qual o compromisso a favor dos outros vá acompanhado do “vacare Deo”, como diziam os antigos, dedicar tempo a Deus, e dedicar tempo a nós mesmos. Francisco, verdadeiro “mendicante de sentido”, em busca permanente do homem e em busca permanente de Deus e de sua vontade, como nos faz ver São Boaventura, buscava incessantemente encontrar-se consigo mesmo e por isso buscava e amava a solidão.


O homem é certamente um “ser social”, criado “para a relação”, mas a experiencia demonstra que só quem pode viver sozinho também sabe viver plenamente as relações. Só quem não teme descer na própria interioridade sabe enfrentar o encontro com a alteridade, com Deus e com os outros. Ao contrário, a incapacidade de interiorização, de habitar a própria vida interior, se converte também em incapacidade de criar e de viver relações sólidas, profundas e duradouras com Deus e com os outros. Certamente que nem toda solidão é positiva: existem formas de fugir dos outros que são patológicas, como o isolamento e o medo da alteridade. Mas entre estas patologias e o ativismo desmedido, a solidão é equilíbrio e harmonia, força e firmeza. Quem assume a solidão como fez Francisco, é quem mostra o valor de confrontar-se consigo mesmo, de reconhecer e aceitar como tarefa própria o ser ele mesmo. Por outro lado, se alguém, como Francisco tem como objetivo buscar a vontade de Deus (cf. LM XIII, 1), não pode buscá-la refugiando-se no “grupo”, no anonimato da multidão, e nem também na fuga solipsista da clausura de si mesmo. Talvez a solidão é um dos maiores sinais do amor: para nós mesmos, para Deus, e para os outros.


A solidão é espaço de unificação do próprio coração e de comunhão com Deus e com os outros. Quando a solidão nos leva ao encontro de nós mesmos, então é purificação das relações que no contínuo “comércio” das pessoas correm o risco de ser insignificantes, e, para nós cristãos, é também um lugar de comunhão com o Senhor. Ao comentar o texto de João 5,13, onde se diz que o homem curado não sabia quem o havia curado, já que Jesus havia desaparecido no meio da multidão, Santo Agostinho escreve: «É difícil ver Jesus em meio à multidão; necessitamos a solidão. Na solidão, de fato, se a alma tem cuidado, Deus se deixa ver. A multidão é ruidosa, para ver a Deus necessitas o silencio». Por outro lado, a solidão é o crisol do amor: as grandes relações humanas e espirituais não podem deixar de cruzar a solidão. Certamente, o cristão, como Jesus, deve encher a solidão com a oração, com a luta espiritual, com o discernimento da vontade de Deus, com a busca de Seu rosto. Francisco em tudo isto se nos apresenta como um verdadeiro mestre, tendo sido um verdadeiro discípulo de Cristo.


De fato, o Cristo, em quem dizemos que cremos e que dizemos amar o encontramos constantemente em lugares afastados para orar, buscando a solidão para viver a intimidade com o Abba e para discernir sua vontade. Aquele que viveu na cruz a plenitude da intimidade com Deus conhecendo o abandono de Deus, recorda ao cristão que a solidão é mistério de comunhão, e nos ensina que a máxima solidão manifestada na cruz é mistério de amor, a maior manifestação do amor do Pai para conosco: «tanto amou Deus ao mundo que deu a seu Filho único» (Jo 3,16); a maior manifestação do amor de Jesus pela humanidade: «como nos amou e se entregou a si mesmo» (Ef 5,2).


«Se alguém quer vir em meu seguimento, renuncie a si mesmo e tome sua cruz cada dia, e siga-me» (Lc 9,23),
escutamos no Evangelho de hoje. Encontramos nestas palavras um compendio da vida cristã, o espelho da Palavra com o qual o discípulo deve conformar seu próprio rosto (cf. St 1,22-25). Como cristãos, nossa vida deve levar impressas os traços de Jesus, o Filho crucificado por amor. Contemplando «ao que transpassaram» (Jo 19,37), a cruz se converteu num selo de pertença a Deus em Jesus (cf. Ap 7,2ss; Ez 9,4). Levar a cruz cada dia é fazer-se carregador de nosso mal, é morrer cotidianamente por Cristo, vivendo para Ele, até poder dizer: «com Cristo estou crucificado:e não vivo eu, senão que é Cristo quem vive em mim» (Gl 2,20). Tomar a cruz significa sentir-se crucificado com Cristo, ser partícipe da Paixão do Senhor Jesus, sentir que somos dele e que já não nos pertencemos mais a nós mesmos. Diz Bento XVI: Para levar a pleno cumprimento a obra da salvação, o Redentor continua a associar a si e a sua missão homens e mulheres dispostos a tomar a cruz e segui-lo. Igual a Cristo, assim também para os cristãos levar a cruz não é opcional, mas uma missão que se deve abraçar com amor. Em nosso mundo atual, onde parecem dominar as forças que dividem e destroem, Cristo continua oferecendo a todos seu claro convite: quem quiser ser meu discípulo, renegue o próprio egoísmo e carregue comigo a cruz. Invoquemos a intercessão do Estigmatizado do Alverne para que o Senhor nos conceda ir com decisão atrás Dele, conformar-nos à Paixão de Cristo e ser partícipes de Sua Ressurreição


Vocabulário


Serafim – criaturas celestes mencionadas unicamente em Is 6,2-6. Na hierarquia angélica, os serafins são os anjos do segundo coro. São os anjos que nos inflamam de amor por Deus. Daí São Francisco ser chamado de “seráfico pai”, pois ele leva-nos todos a amar a Deus. Dizia ele: “Devemos amar o amor daquele que nos amou” (2C 196)

Alverne – o monte alverne ergue-se majestoso no centro da Itália. Eleva-se até 1283 metros acima do nível do mar em seu pico mais alto conhecido pelo nome de La Penna. O Santuário de La Verna, erguido para celebrar a experiência maravilhosa da estigmatização de Francisco de Assis, está a 1128m de altura. Para o monte Alverne Francisco e seus companheiros sempre iam para rezar e estar a sós com Deus.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

UMA LUZ PARA O NOSSO TEMPO

Carta do Ministro Geral da OFM, Frei José Rodriguéz Carballo, por ocasião da canonização de Camila Batista de Varano, OSC

Caríssimos irmãos e irmãs,
O Senhor lhes dê a paz!

Aos 19 de fevereiro de 2010, Bento XVI, em consistório público, inscreveu no Catálogo dos Santos uma irmã nossa, a Clarissa Camila Batista de Varano. A canonização acontecerá em São Pedro no dia 17 de outubro de 2010.

Com verdadeira alegria, do mosteiro em que Camila Batista de Varano viveu e onde repousa o seu corpo, onde me encontro com os confrades do Definitório para frequentar por alguns dias a escola de Camila, desejo comunicar-lhes esta “boa notícia”, que fará felizes todas as Clarissas: o carisma clariano é capaz de produzir frutos de santidade em cada época! E isto acontece no ano de 2010, ano que, no caminho de preparação para a celebração do VIII centenário dos inícios de vida de Santa Clara em São Damião, é dedicado à contemplação. Uma “boa notícia” que torna orgulhosas as Clarissas de Camerino, fiéis guardas do corpo da nova santa e da sua memória.

Mas é um acontecimento que envolve também a nós, Frades Menores. A canonização da Beata Camila Batista de Varano é a demonstração de que a “plantinha” do pai São Francisco continua a alegrar o seu coração com novos e vigorosos rebentos. Além disso, cada etapa do itinerário espiritual da Beata foi acompanhada pelos Frades Menores – Domingos de Leonissa, Pacífico de Urbino e Pedro de Mogliano – figuras excelentes da “Observância franciscana”, porta-vozes daquele fervor de renovação que marcou a Ordem franciscana e que acabou por contagiar também Camila Batista na sua ação de renovação espiritual, reintroduzindo, nos mosteiros por ela fundados, a Regra de Santa Clara.

Enfim, a canonização de Camila Batista de Varano, como conclusão das celebrações do VIII centenário da fundação da Ordem dos Frades Menores, recorda-nos que a santidade constitui a fundamental via para dar significatividade à nossa vocação e missão.

Não é o caso agora de focalizar a sua vida, a sua experiência humana e espiritual, mesmo porque neste sentido existe uma abundante literatura. Esta minha carta-comunicação quer somente estimular um maior conhecimento desta extraordinária mística, sobretudo através da leitura de seus escritos, pelo menos os mais importantes, como Vita spirituale (Autobiografia) e I dolori mentali de Gesù nella sua Passione.
Breves notas biográficas

Camila de Varano nasceu em Camerino em 1458, filha de Júlio César de Varano. É filha ilegítima, mas predileta do pai e da mulher Giovanna Malatesta, que foi mais do que mãe. Dos seus numerosos escritos, especialmente, se deduz que Camila tenha recebido uma sólida formação humanística, favorecida por uma inteligência aguda, por um caráter forte e tenaz e pela vontade de viver e divertir-se.

Depois de ter resistido por vários anos ao chamado do Senhor, no dia 4 de novembro de 1481, Camila ingressou no Mosteiro das Irmãs Pobres de Santa Clara em Urbino, assumindo o nome de Batista. Aos 14 de janeiro de 1484, deu vida a um novo Mosteiro em Camerino, onde introduziu a Regra de Santa Clara. Em 1502, para fugir do assédio da sua cidade por parte de César Bórgia, Ir. Batista refugiou-se em Atri, retornando depois a Camerino nos inícios de 1504. Depois de ter fundado os Mosteiros das Clarissas em Fermo (1505-1506) e em São Severino Marche (1521-1522), morreu em Camerino no dia 13 de maio de 1524.

Aos 7 de abril de 1843, o Papa Gregório XVI reconheceu o culto público, atribuído a ela desde tempos antiquíssimos, e declarou-a Beata. Aos 8 de abril de 1891, Leão XIII aprovou as atas do Processo, em vista da canonização, e no dia 4 de fevereiro de 1892 os seus escritos. Aos 17 de outubro de 2010, Bento XVI a proclamará Santa.

Um coração tenso

Camila Batista de Varano viveu radicalmente o ideal evangélico de São Francisco e de Santa Clara, mas foi marcada fortemente também pela nova sensibilidade cultural e espiritual que estava surgindo com o renascimento, pelas circunstâncias trágicas da sua família e da sua cidade, pela trama complexa da vida da Ordem dos Frades Menores e das Irmãs Pobres de Santa Clara. Todas estas circunstâncias plasmaram o seu espírito que, dócil à ação da graça divina, deu vida a uma experiência evangélica que incidiu profundamente no tempo em que viveu Camila Batista.

O segredo desta “transfiguração”? A sua vida e o seu caminho de conversão são profundamente determinados pelo encontro com o Crucificado. Como não lembrar-se do encontro de São Francisco com o Crucificado em São Damião? Como não acolher o convite de Santa Clara a contemplar “o mais belo entre os filhos dos homens”, pendurado na Cruz? Mas é a própria Camila Batista a nos guiar com os seus escritos: “a memória da Paixão de Cristo é como uma arca dos tesouros celestes, uma porta que permite entrar e degustar o glorioso Jesus e uma perfeita mestra de todas as artes espirituais, uma fonte inexaurível de água viva, um poço profundíssimo dos segredos de Deus... Quem quiser estar livre de toda impureza e ter um sinal da glória futura e da beatitude... procure esta doce memória da Paixão de Cristo, como o apóstolo Paulo, que portava continuamente os estigmas da Paixão em seu corpo”.

Tudo teve início no longínquo 1466 (ou 1468), quando Frei Domingos de Leonissa exortou os fiéis, na pregação da Sexta-feira santa, a recordarem a Paixão de Cristo. Entre os tantos que o escutaram, uma menina de 8/10 anos, Camila de Varano, o tomou a sério, até apegar-se a Cristo pobre e crucificado com todo o seu ser, deixando-se transfigurar por esta presença de vida, pelas dores, alegrias, aspirações e profundas contradições da sua época e da sua Ordem.

A santidade de Camila Batista envolve-nos, como Irmãs Pobres de Santa Clara, como Frades Menores e como mulheres e homens do nosso tempo, porque torna visível a tensão do coração humano, o seu difícil caminho de conversão e, ao mesmo tempo, a fecundidade da conformação à cruz de Cristo: na santidade desta mulher singular, a luz da ressurreição, da plenitude do homem em Cristo, resplende através dos séculos.

Atualidade de Camila Batista de Varano

Camila Batista revela-se, antes de tudo, como uma mulher capaz de aceitar o desafio da existência, encarnando uma “paixão pela vida”, vivida como busca incessante da verdade e da liberdade. Não foi passiva, não sofreu simplesmente os condicionamentos familiares ou políticos que teriam podido aprisionar a sua existência. Soube ser protagonista original da sua vida, construindo a sua humanidade em um dinamismo de liberdade voltado à busca genuína dos valores.

Em uma época caracterizada pelo relativismo moral e pela superficialidade intelectual, em que os modelos sociais e midiáticos são tão possessivos e dominantes, necessitamos hoje do exemplo de um espírito livre e valente que saiba viver com coragem a sua originalidade.

Camila Batista apresenta-se aos nossos olhos como uma figura extraordinariamente atual. Ela vive em uma época só aparentemente diferente da nossa, feita de lutas e de guerras, de dramas e de ódio, mas também de grandes impulsos humanos, artísticos e espirituais.

Através da canonização da Beata Camila Batista, a Igreja realiza um gesto profético através do qual aponta à humanidade inteira, a todos os batizados e à família franciscana esta figura de mulher verdadeiramente evangélica, sinal eloquente de conversão realizada, de resposta coerente ao Evangelho e à vocação a que todo homem é chamado.

Uma luz para a humanidade

O que foi a vida de Camila Batista, senão um incessante, comovido e apaixonado silêncio que escuta aquela Palavra da cruz que revela a plenitude da vida e do amor? O que foi a sua experiência, senão um contínuo imergir-se no mistério pascal em que se pode ler e re-encontrar o próprio sofrimento e descobri-lo habitado, remido, transfigurado?

Ela desejou que a sua vida fosse uma contínua sexta-feira santa. O sentido deste desejo está na mensagem que Camila Batista entrega à humanidade inteira: no sofrer humano está escondida a luz e a presença do Ressuscitado que transfigura cada dor e preenche toda solidão.

Contemplando a paixão, de Cristo, Camila Batista contempla a paixão do homem de cada tempo e de cada lugar, descobre e indica a cada um o sentido, a luz e a força que a humanidade incessantemente invoca.

Na nossa época, marcada por uma profunda crise econômica que fez emergir uma significativa urgência ética no agir e no pensar, Camila Batista indica uma via a seguir: colocar dentro da história os valores evangélicos do dom e da gratuidade. O verdadeiro contemplativo, de fato, não se subtrai à responsabilidade de mergulhar-se na história, mas sabe que é enviado a tornar presente o rosto do Deus contemplado, através da restituição dos dons de graça recebidos.

À humanidade perdida por causa da emergência educativa, evidenciada pelo difuso mal-estar dos jovens e pela pobreza de pontos de referência, Camila Batista indica a urgência de educadores, mestres e testemunhas credíveis. Os seus escritos nos oferecem diversas figuras de pais na fé, sobretudo Frades, que acompanharam e guiaram o seu caminho e, contemporaneamente, nos revelam a sua extraordinária capacidade pedagógica. Camila Batista, como mãe espiritual e como guia sábia, sabe fazer-se modelo de vida e canal da graça, como ela própria relata: “É necessário ser “vaso”, antes que “canal”. Por quase vinte anos, esta tua mãe foi “vaso”, isto é, procurou guardar, conter a graça em si, depois, como “canal”, a difundiu e escreveu para outros”.

Na época da comunicação de massa, da Internet e do progressivo desenvolvimento dos sociais network, assistimos, quase impotentes, a um singular paradoxo: de uma parte, de fato, emerge uma incontenível necessidade de comunicação e de informação em tempo real; de outra parte, se desenvolve um crescente medo nos confrontos com o diferente, estigmatizado na figura do estrangeiro que busca às nossas portas, com uma consequente elevação das fronteiras e dos muros que impedem, a acolhida e a partilha. Neste contexto, Camila Batista revela-se mestra de diálogo, entendido como necessidade humana, vital e cotidiana. O Tu de Jesus Cristo contemplado e amado conduziu-a ao tu dos irmãos e das irmãs, fazendo dela uma mulher extraordinária de relação. O diálogo é, de fato, o tecido, o estilo e a categoria predominante do seu modo de escrever e de sua experiência mística.

Em uma sociedade líquida, cética quanto ao ideal da fidelidade, capaz de assumir somente empenhos temporários e condicionados, Camila Batista provoca-nos com a sua capacidade de fazer escolhas definitivas e radicais na força do amor e do perdão incondicional. É uma clarissa autêntica que soube crer no Amor (1Jo 4,16).

Esta genuína filha de Santa Clara se deixou ferir pelo amor de Cristo, ao qual ela se deu totalmente com impulso apaixonado e exclusivo, fiel e incondicional, capaz de amar os inimigos e de enfrentar com extraordinária fortaleza as duríssimas provas que marcaram a sua vida.

Uma luz para a Igreja

Camila Batista – seguindo o exemplo e o ensinamento de Clara e Francisco – viveu uma fidelidade heroica à Igreja, mesmo quando deveu enfrentar, por ela, sofrimentos amaríssimos. Esta sua tenaz obediência se enraíza na consciência de que a Igreja é a própria imagem de Cristo, seu corpo vivo e sua concreta presença na história, dentro da qual se realiza eficazmente a obra da nossa salvação. Não houve compromisso ou fragilidade humana que conseguisse desviá-la do propósito de viver esta total pertença à Igreja: o sofrimento não a tornou rebelde, mas ainda mais fiel no oferecer orações e súplicas aflitas a Deus pela “renovação da igreja”.

Temos necessidade, também nós, sobretudo no nosso tempo, de redescobrir o gosto desta pertença eclesial que gera uma fecunda e universal comunhão em Cristo.

Também por este motivo, a canonização oferece Camila como modelo a todos os batizados e como exemplo de vida cristã: a sua luz é a da relação perseverante e apaixonada com Cristo crucificado, de uma martyria feita credível pela pobreza, de uma koinonia concretizada na fraternidade, de uma diakonia radicada na contemplação; uma luz autorizada, capaz de orientar todo caminho eclesial.

* Escolhendo professar a Regra de Clara de Assis, de fato, Camila Batista indica a cada cristão a via da pobreza como via de testemunho radical, como autêntica martyria: “Esta serva de Deus comprou caro para si e para os outros a pobreza, e somente a ela tocou pagar o preço; de modo que lhe custa caro a pobreza, mais que a riqueza aos ricos, e mais ela a desejou e buscou do que o mundo busca o dinheiro”.
* Vivendo plenamente o carisma franciscano, ela mostra à Igreja a via da fraternidade como atuação da koinonia: uma fraternidade que pede a renúncia ao poder e ao individualismo e chama a um amor gratuito, evangélico, generoso, a uma caridade crucifixa, semelhante à da Perfeita alegria de Francisco: “Ó meu clementíssimo Deus, se Tu me revelasses todos os segredos do teu sacratíssimo Coração e, cada dia, me mostrasses todas as hierarquias angélicas, se cada dia eu ressuscitasse os mortos, não crerei por isto que Tu me amas com infinito amor. Mas, quando eu sentir ter obtido a graça de um perfeito amor, isto é, de fazer bem a quem me faz mal, de dizer bem e louvar a quem sei que me diz o mal e injustamente me censura, somente então por este sinal infalível, meu Pai clementíssimo, crerei ser tua verdadeira filha. Somente então, serei conforme ao teu diletíssimo Filho Jesus Cristo Crucificado, que é o único bem da minha alma, conforme a ele, ó Pai, que, estando na cruz, orou a ti pelos que o crucificavam”.
* Herdeira exemplar de Clara de Assis, Camila oferece-nos a via da contemplação como real e específica diakonia. A Igreja inteira e cada batizado, mediante a contemplação, volta à sua fonte vital e desenvolve um ministério de intercessão: é este o serviço que Clara e Camila Batista desenvolveram, recordando-nos o primado de Deus e a misteriosa fecundidade apostólica da contemplação, destinada a incidir profundamente na vida da Igreja.

Uma luz para a família franciscana


Camila Batista manifesta-se como uma cristã capaz de viver com seriedade e intensidade a busca de Deus, radicando-se na experiência bíblica. Embora dotada de uma refinada e elevada formação cultural, o seu modo de ler a Escritura nunca assumiu o estilo de uma erudição árida. À luz da Palavra, relê o seu itinerário vocacional e toda a sua vida, servindo-se do modelo bíblico: os grandes acontecimentos da história da salvação estão na base da sua espiritualidade quase como profecias que se realizam.
Aproximando-nos de seus escritos, damo-nos conta de que a liturgia é o lugar privilegiado em que ela escuta a Palavra, alcançando aí a luz e a força para realizar as suas escolhas.

“Tu, Senhor, por graça nasceste na minha alma e me mostraste a via e a luz e lume da verdade para chegar a ti, verdadeiro paraíso. Nas trevas e escuridão do mundo, me deste a vista, o ouvir e o falar e o caminhar – pois que na verdade eu era cega, surda e muda – e me ressuscitaste em ti, verdadeira vida, que dás vida a cada coisa que tem vida”.

Camila Batista mostra-nos a via concreta para observar o santo Evangelho, para colocá-lo em prática e traduzi-lo na existência cotidiana. O voto de derramar a cada sexta-feira uma lágrima em memória da Paixão de Cristo, ao qual permanece tenazmente fiel mesmo imersa na vida da corte, testemunha-nos aquele envolvimento, aquela participação “física” e total ao mistério de Cristo que se torna relação viva e fecunda, segundo a mais genuína espiritualidade franciscana.

Na sociedade de hoje que favorece uma religiosidade intimista e frágil, reduzindo a fé a uma pulsão emotiva e desencarnada, Camila Batista sugere a toda a família franciscana uma via segura: viver o Evangelho com paixão e radicalidade e restituir “amor por amor, sangue por sangue, vida por vida”.
Somente assim poderemos ser uma presença significativa na Igreja e na história.

Conclusão

Com o anúncio desta “boa notícia”, não pretendo simplesmente notificar que uma nova Santa é acrescentada à árvore já viçosa do carisma franciscano-clariano, mas desejo assinalar sobretudo a fecundidade de uma vida vivida segundo o Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo. No evoluir da história e no constante empenho por renová-la, de fato, são exatamente “os santos, guiados pela luz de Deus – dizia Bento XVI na Audiência de 13 de janeiro de 2010 – os autênticos reformadores da vida da Igreja e da sociedade. Mestres com a palavra e testemunhas com o exemplo, eles sabem promover uma renovação eclesial estável e profunda, porque eles mesmos são profundamente renovados, estão em contato com a verdadeira novidade: a presença de Deus no mundo. Esta consoladora realidade – de que em cada geração nascem santos e trazem a criatividade da renovação – acompanha constantemente a história da Igreja em meio às tristezas e aos aspectos negativos do seu caminho. Vemos, de fato, século após século, nascerem também as forças da reforma e da renovação, porque a novidade de Deus é inexorável e dá sempre nova força para andar adiante”.

Caros irmãos e irmãs, eu gostaria de deixar-lhes dois pensamentos de Camila Batista que me marcaram de modo particular. Comentando as grandes tentações vividas, teria depois escrito com convicção: “Bem-aventurada aquela criatura que por nenhuma tentação deixa o bem começado!”. De outra parte, crescida na espiritualidade da restituição tão cara a Francisco, Camila rezava: “Faze com que eu te restitua amor por amor, sangue por sangue, vida por vida”. Tudo um exemplo de fidelidade e de perseverança no bem e do viver na lógica do dom total de si mesma àquele que a amou por primeiro.

Irmãos e irmãs, sejamos santos como ele é santo! A santidade é a vocação mais alta à qual pode tender um homem, uma mulher. A santidade é a nossa vocação.

Seu irmão, Ministro e servo

FR. JOSÉ RODRÍGUEZ CARBALLO
Ministro geral

Camerino, 5 de julho de 2010

terça-feira, 7 de setembro de 2010

16ª EDIÇÃO DO GRITO DOS EXCLUÍDOS


"Onde estão nossos direitos? Vamos às ruas para construir um projeto popular". Este é o lema da 16ª edição do Grito dos Excluídos que acontece em todo país, no próximo dia 7 de setembro. Aqui no Recife, a concentração será, às 8h, na Praça Osvaldo Cruz, bairro da Boa Vista. Às 10h, os manifestantes sairão em passeata até o Pátio do Carmo, no bairro de São José.

Histórico
- O Grito teve origem no Setor Pastoral Social da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), como uma forma de dar continuidade à reflexão da Campanha da Fraternidade de 1995, cujo lema - Eras tu, Senhor - abordava o tema Fraternidade e Excluídos. A mobilização tem como objetivo, transformar as comemorações passivas que ocorrem no Dia da Independência do Brasil, em um momento de cidadania consciente e ativa por parte da população. Hoje, a manifestação tem o apoio e a participação de diversas organizações da sociedade civil.

O que é

O Grito dos Excluídos é uma manifestação popular carregada de simbolismo, é um espaço de animação e profecia, sempre aberto e plural de pessoas, grupos, entidades, igrejas e movimentos sociais comprometidos com as causas dos excluídos.

O Grito dos Excluídos, como indica a própria expressão, constitui-se numa mobilização com três sentidos:
• Denunciar o modelo político e econômico que, ao mesmo tempo, concentra riqueza e renda e condena milhões de pessoas à exclusão social;
• Tornar público, nas ruas e praças, o rosto desfigurado dos grupos excluídos, vítimas do desemprego, da miséria e da fome;
• Propor caminhos alternativos ao modelo econômico neoliberal, de forma a desenvolver uma política de inclusão social, com a participação ampla de todos os cidadãos.

O Grito se define como um conjunto de manifestações realizadas no Dia da Pátria, 7 de setembro, tentando chamar à atenção da sociedade para as condições de crescente exclusão social na sociedade brasileira. Não é um movimento nem uma campanha, mas um espaço de participação livre e popular, em que os próprios excluídos, junto com os movimentos e entidades que os defendem, trazem à luz o protesto oculto nos esconderijos da sociedade e, ao mesmo tempo, o anseio por mudanças.

As atividades são as mais variadas: atos públicos, romarias, celebrações especiais, seminários e cursos de reflexão, blocos na rua, caminhadas, teatro, música, dança, feiras de economia solidária, acampamentos – e se estendem por todo o território nacional.

Para iniciarmos a apresentação, se faz necessário dizer o que é o Grito dos Excluídos

O Grito dos Excluídos é uma iniciativa que se compõe de uma série de eventos e mobilizações que se realizam ao redor da Semana da Pátria, ou seja, de 01 a 06 finalizando-se no dia 07 de setembro, ou um pouco antes, isso depende da realidade local. Não se trata exatamente de um movimento, uma campanha ou uma organização, mas de um espaço de convergência em que vários atores sociais que se juntam para protestar e propor caminhos novos. As principais manifestações ocorrem no Dia da Independência, pois seu eixo fundamental gira em torno da soberania nacional. O objetivo é transformar uma participação passiva, nas comemorações dessa data, em uma cidadania consciente e ativa por parte da população.
Contudo o Grito dos Excluídos não se limita nas ações do dia 07 de setembro. De ponta a ponta do país, podemos subdividir as atividades em um antes, um durante e um depois. Um antes, se nos atemos às reuniões da coordenação nacional, ao encontro dos articuladores, à preparação do material, à divulgação e organização e a uma série de eventos que se destinam à preparação dos agentes e lideranças; um durante quando as ruas e praças das principais cidades do Brasil, com destaque para o Santuário de Aparecida, em São Paulo, onde o Grito e Romaria dos Trabalhadores fazem uma grande parceria. Essas manifestações se enchem de manifestantes, de gritos e de utopia; um depois, no sentido de avaliar e garantir a continuidade das ações, numa espécie de fio condutor que une num único processo os Gritos realizados nesses rincões afora dede grande Brasil.

Por que Grito dos Excluídos?

O pressuposto básico do Grito é o contexto de aprofundamento do modelo neoliberal como resposta à crise generalizada a partir dos anos 70 e que se agrava nas décadas seguintes. A economia capitalista globalizada, a precarização das relações de trabalho e a guerra por novos mercados geram massas excluídas por todo o mundo, especialmente nos países periféricos.
Os movimentos sociais reagem. No Brasil, as Igrejas cristãs juntamente com outros parceiros promovem na década de 90 as Semanas Sociais. Cresce a consciência das causas e efeitos da exclusão social, como o desemprego, a miséria e a violência, entre outros. O fruto amadurece e nasce o Grito dos Excluídos. Trata-se de uma forma criativa de levar às ruas, praças e campos o protesto contra esse estado de coisas. Os diversos atores sociais se dão conta de que é necessário e urgente dar visibilidade sócio-política à indignação que fermenta nos porões da sociedade, os excluídos/as. Se o mercado tem o direito de dobrar as autoridades políticas com seu “nervosismo”, os setores marginalizados da população também podem e devem tornar pública sua condição de excluídos.

Por que o 7 de setembro

Desde 1995, o Grito dos Excluídos realiza-se no dia 7 de setembro. É o dia da comemoração da independência do Brasil. Nada melhor do que esta data para refletir sobre a soberania nacional, que é o eixo central das mobilizações do Grito.
Nesta perspectiva, o Grito se propõe a superar um patriotismo passivo em vista de uma cidadania ativa e de participação, colaborando na construção de uma nova sociedade, justa, solidária, plural e fraterna.
O Dia da Pátria, além de um dia de festa e celebração, vai se tornando também em um dia de consciência política de luta por uma nova ordem nacional e mundial. É um dia de sair às ruas, comemorar, refletir, reivindicar e lutar.
O Grito é um processo, que compreende um tempo de preparação e pré-mobilização, seguido de compromissos concretos que dão continuidade às atividades.

PROGRAMAÇÃO

Recife/PE: O Grito será no dia 07/09 – concentração às 9h em frente à Celpe e na Praça Osvaldo Cruz.
Caruaru/PE: O Grito será realizado por meio de debates temáticos, sempre às 19h na Fafica e Academia de Letras. Dia 04/09, às 14h – Grito das Mulheres do Morro Bom Jesus, grupo de mulheres em ação, local: Centro Missionário D. Helder Câmara. ; 05/09 – Grito dos Excluídos, às 16h, ato público com a presença das organizações e apresentações culturais das comunidades excluídas de Caruaru, local: Pólo Cultural (perto da estação ferroviária).

Garanhuns/PE: Dia 07/09, Grito será realizado após o desfile oficial, contra a corrupção, a violência, injustiças, má distribuição de rende e em defesa dos direitos básicos e sociais.

Nazaré e Paudalho/PE: Estão preparando e organizando o grito pela segunda vez, onde reunirá as cidade de Nazaré e Paudalho, irão gritar juntos os analfabetos e educadores por direito a educação pra todos e catadores. O grito será no dia 07/09.

Limoeiro/PE: Estarão fazendo a semana pré-grito com debates sobre o tema do grito. O grito será no dia 07.

Fonte: http://www.arquidioceseolindarecife.org.br
http://www.gritodosexcluidos.org

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

A AMAZÔNIA NOS INTERPELA - Dia 05 de setembro: Dia da Amazônia


Venho, por meio desta, lembrar todos os confrades e comunidades que no próximo dia 05 de setembro celebramos o “Dia da Amazônia”. Nesta data, como já combinado na última assembleia do SIFEM e a pedido da CFMB, devemos lembrar em nossas comunidades e suas celebrações do fim de semana mais próximo do dia 05 o nosso compromisso com a Amazônia e com toda a sua realidade, sobretudo, neste momento que gestamos novos projetos de presenças naquelas realidades, tanto em nível de CFMB quanto de UCLAF/OFM. Estes projetos precisam tornar-se realidade o quanto antes, pois tempo urge. Então devemos nos empenhar no compromisso e na disponibilidade de orações, irmãos e financeiro.
Por isso, o convite é que além das orações neste fim de semana, cada comunidade se empenhe em fazer ao menos uma coleta no próximo fim de semana que se reverta para o fundo das missões da CFMB na Amazônia que está sendo custodiado na Custódia de São Benedito da Amazônia.

1 – A importância da Amazônia para a Ordem dos Frades Menores

a) Peculiaridades da Amazônia: riqueza natural. "A Amazônia é um dos maiores, diversos, complexos e ricos biomas do mundo. Vista a partir do cosmo, a Amazônia pan-americana ocupa uma área de 7,01 milhões de Km² e corresponde a 5% da superfície da terra, 40% da América do Sul, 59% do Brasil. Contém 20% da disponibilidade mundial de água doce não-congelada e 80% da água disponível no território brasileiro. Abriga 34% das reservas mundiais de florestas e uma gigantesca reserva de minérios. Sua diversidade biológica de ecossistemas, espécies e germoplasma é a mais intensa e rica do planeta: cerca de 30% de todas as espécies de fauna e flora do mundo encontram-se nesta região. O sistema fluvial Amazonas-Solimões-Ucayally representa o mais extenso rio do mundo, com 6.671 Km; a bacia hidrográfica do rio Amazonas é constituída por cerca de 1.100 rios, e o rio Amazonas joga no Oceano Atlântico entre 200 a 220 mil metros cúbicos de água por segundo, o que representa 15,5% de toda água doce que entra diariamente nos oceanos" (CF 2007, 15).
Riqueza humana e cultural: A Amazônia conta com uma população de 23 milhões de habitantes, entre os quais 165 são povos indígenas e 65 povos são não contactados. Além da rica biodiversidade, nela se encontra uma rica diversidade cultural, lingüística e religiosa. Em particular os povos indígenas, ribeirinhos e quilombolas vivem em harmonia com a natureza e mostram que é possível conviver com a floresta e os rios sem a necessidade de mercantilização e devastação.
b) Os desafios atuais: a Amazônia sofre os efeitos devastadores da lógica da mercantilização de todas as coisas. Ela desafia a recolocar a pessoa humana no “jardim”, a recuperar a sacralidade do cosmo e recriar as relações de reciprocidade e de fraternidade entre todas as criaturas. Os povos indígenas, ribeirinhos e quilombolas carregam em si as sementes que nos ajudam a adquirir uma nova visão da vida.
A Amazônia é atualmente palco de no mínimo duas vertentes fundamentais de um novo colonialismo: o avanço do agronegócio, das mineradoras, das madeireiras e outros projetos de exploração que implicam numa ampla devastação e destruição das florestas, dos rios e das populações tradicionais; a privatização e apropriação de vastas áreas de florestas em vista do acúmulo de créditos de carbono e dos recursos genéticos, sendo que as populações ali existentes são pagas para conservar, porém lhes é tirada a condição de sujeito social (colonialismo verde). Junto se verifica o progressivo processo de privatização da água doce, uma rápida degradação do ambiente onde se localizam as principais nascentes dos grandes rios da bacia amazônica, a presença de rotas de tráfico de drogas, a invasão dos grupos econômicos com seus grandes projetos de exploração que forçam as populações a migrarem para os grandes centros urbanos, onde caem na miséria, na prostituição, nas drogas, etc.
c) A presença franciscana: os frades menores estão presentes nesta região desde o século XVI. Ao longo deste tempo a presença franciscana se manteve praticamente ininterrupta. A partir dos inícios do século XIX, esta presença se diversificou e ampliou com a vinda dos frades capuchinhos, da TOR e das congregações franciscanas femininas. Esta presença tem a característica de ser pouco numerosa e desarticulada entre si e predominantemente de missionários/as estrangeiros/as. A partir do século XX, a Igreja confiou grandes territórios de missão (Prelazias, Prefeituras e Vicariatos) aos franciscanos em seus diferentes ramos.
d) Lugar de missão franciscana: a Amazônia carrega em seu ventre sementes e paradigmas que significam o futuro do planeta e da humanidade. A sua imensa riqueza natural pode representar um ponto de equilíbrio no conjunto da nossa casa comum. A sua variada riqueza humana, cultural e religiosa pode contribuir para um novo estilo de vida em base à gratuidade, simplicidade, reciprocidade, dignidade, sacralidade, sentido da festa. Esta realidade nos desafia ao diálogo ecumênico, inter-religioso e inter-cultural.
Nós, a partir do carisma franciscano, podemos encontrar neste chão, condições favoráveis para resgatar muito da vitalidade das nossas origens: a visão da sacralidade de toda a criação, as relações de reciprocidade, de fraternidade, de não- apropriação das coisas e da terra, a austeridade, a itinerância e a mobilidade.
Por outro lado, somos desafiados a dar a nossa contribuição no que tange as realidades fundamentais: defesa e promoção da vida; valorização da diversidade cultural e aprendizagem dos processos de inculturação; acolhida da religiosidade popular; compromisso com a integridade da criação; sintonia e comunhão com a Igreja local na busca por encarnação na realidade e por uma evangelização libertadora.
Iluminados pelo Espírito do Senhor, inspirados pelo carisma franciscano e obedientes aos documentos da Igreja (Documento de Aparecida) e da Igreja da Amazônia (Documento “Discípulos Missionários na Amazônia”), sob a proteção de Nossa Senhora da Amazônia e sensibilizados pelos clamores dos povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas, populações das periferias, migrantes e refugiados reafirmamos o nosso compromisso com a missão neste chão.
Quem nos convoca é o próprio Deus Trindade. Nossa resposta de frades menores, à luz dos sinais dos tempos, a serviço do Reino de Deus, é a de sermos fiéis discípulos e missionários de Jesus Cristo e fiéis a S. Francisco e seu/nosso carisma. Também, pedimos à Mãe de Deus que zele por todos os povos da Amazônia. Ela, que é a estrela da evangelização, guie os nossos passos no caminho do Reino: Mãe Nossa, protegei a família brasileira e latino-americana e ajudai-nos a fazer tudo o que o vosso Filho nos disser. Amém!

Frei Fernando Ap. dos Santos, OFM
Coordenador do SIFEM/CFMB

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

A REALIDADE NOS INTERPELA

No próximo dia 5 de setembro faz um mês que 33 mineiros chilenos estão soterrados na Mina San José, no deserto do Atacama. Os companheiros que escaparam, gritaram de alegria e logo cantaram ao saber que os que ficaram presos a 700 metros de profundidade estavam vivos e ilesos após o desmoronamento que os prendeu, depois do primeiro contato direto realizado na segunda-feira, dia 23, do mês passado, como mostraram imagens dos noticiários da televisão em todo o mundo.
No domingo passado, dia 29 de agosto, os mineiros soterrados tiveram o primeiro contato telefônico direto com seus familiares. Seus parentes fizeram filas para usar uma cabine especial de telefone. Cada um teve cerca de um minuto para conversar com os familiares.
O drama continua e estamos acompanhando o sofrimento desses 33 mineiros, a apreensão de seus familiares e a tentativa de resgate, envolvendo alta tecnologia e ao mesmo tempo a nossa pequenez diante da grandiosidade da natureza por nós explorada.
Aproveito este momento tão dramático para rezar por esses 33 irmãos nossos, seus familiares e todo povo chileno. Mas não podemos esquecer outros dramas que nos tocam de perto como a destruição causada pelas enchentes em Pernambuco e Alagoas e que continuam interpelando nossa sensibilidade para que se traduzam em gestos concretos de mobilização e solidariedade!
E o que dizer da chacina ocorrida no dia 22 de agosto passado em San Fernando, na fronteira do México com os Estados Unidos que ceifou violentamente a vida de 72 pessoas, 58 homens e 14 mulheres, incluindo algumas crianças e uma grávida que seguiam para os Estados Unidos em busca de dias melhores? Caíram nas mãos de traficantes que os enganaram prometendo atravessá-los do México para os Estados Unidos. Dois brasileiros estão entre as vítimas, incluindo hondurenhos, equatorianos e salvadorenhos!
A cada dia somos surpreendidos por muitas notícias, revestidas de sensacionalismo, mas que revelam a realidade nua e crua de uma humanidade que, apesar do progresso tecnológico alcançado, ainda está longe da paz, da justiça e corre o risco de ficar insensível à dor e ao sofrimento de milhões de pessoas bem como da própria natureza destruída diariamente.
O que fazer para não perdermos a sensibilidade que mobiliza e gera solidariedade? O que fazer para não perdermos a oportunidade de, nós mesmos, sermos instrumento de Deus e mediadores de palavras e gestos que salvam?
É preciso que façamos a experiência evangélica de Francisco de Assis que diante de uma igrejinha em ruínas para, entra e escuta Cristo lhe falando: “Francisco, não vês que minha casa está em ruínas?” Francisco vai, restaura a igrejinha e compreende que a casa a ser restaurada é a humanidade, é cada um de nós arruinados pelo egoísmo e pela insensibilidade! Francisco nos últimos dias de sua vida, ainda queria fazer alguma coisa boa pelo próximo e questionava e motivava a si e a seus frades dizendo: “Irmãos, comecemos a fazer alguma coisa de bom, pois até agora pouco ou nada fizemos!”
Não podemos cruzar os braços e voltarmo-nos para nossos problemas e tornar-nos insensíveis ou deprimirmo-nos! Precisamos abrir os olhos, os ouvidos e o coração e ter os mesmos sentimentos de Cristo Jesus (cf. Fl 2,5) e encontrar mil razões para viver, dando o melhor de nós e tornando-nos instrumento de paz e bem

Frei Marconi Lins, ofm
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